18 de dezembro de 2005

Dias sem dia

Outra vez
Nasce um sol
Um sol de ilusão
Cuja função
É fazer renascer
A cada dia
Nestes dias sem dia
Outra noite
Mais escura e fria
A mesma noite
De outro dia
Todo dia

13 de dezembro de 2005

A falta

Acariciou o próprio corpo, levado pela falta a ignorar a linha do patético, na tentativa de reproduzir o toque daquelas mãos finas e quase sempre frias. Fazia-se médium pra si mesmo do rastro que ela deixara em sua memória corporal, médium daquela ausência tão sentida, incorporando o modo dela de lhe tocar delicadamente a nuca. Sua própria nuca. Quase beijou as mãos, como ela faria, mas teve vergonha. Cruelmente mentia pra si mesmo, tentando ativar no seu corpo, na sua mente, os caminhos que conhecera quando tendo-a ao lado, apenas para acentuar a consciência da falta.

10 de dezembro de 2005

Ao perdedor

Ao perdedor, as canções
Os poemas, pensamentos,
Sublimações
Ao perdedor seu lugar na história
Reescrita na fluidez conveniente da memória
De antigos cúmplices
No que não foi
Ao perdedor, as aflitivas horas
Perceber que confirma
Rangendo os dentes
Que merece a derrota e a dor
Que fariam ranger os dentes
De qualquer vencedor
Ao perdedor, o futuro
De novo?
Descobertas, renascimentos,
Auroras
O amor agora era vaidade
Ao perdedor, a verdade
Compreender
Que sempre foram as coisas
Como passaram a sempre ser
Porque perdeu
Ao perdedor,
Escrever.

4 de dezembro de 2005

Soneto 110

Resvalando a beira dos precipícios
Em passadas sem rumo e sem norte,
O ansioso andarilho deixa indícios,
Em sua jornada diante da Morte.

Deixando de seu sangue os resquícios
O testemunho de seus tantos cortes,
O ansioso enumera os seus suplícios
Em seu íntimo os golpes da má Sorte.

Rastejando vai sofrendo inquieto
A escavar sempre o mesmo abismo
Atordoado pelos velhos sismos,

E tropeçando vai caindo incerto
A procurar sempre o infindo saber
Inconsolado quando vai morrer.


Leonardo de Magalhaens